Ser treinador de futebol é uma profissão apaixonante e de risco, a mais exigente que conheço. A instabilidade nas carreiras é elevada e as exigências são brutais.
Os contextos dos treinadores são “desafia dores”, mas quem treina o treinador, a dor do “treina a dor”? Para que tenha resultados, bem-estar, qualidade de vida, desempenhos...
Cada vez mais surgem notícias sobre casos de saúde mental no desporto, de atletas, ansiedade, ataques de pânico, stress, depressão, consumo desequilibrado de álcool e drogas, pensamentos suicidas. O assunto é sério, mas fala-se pouco sobre isto, muito menos em prevenção e de treinadores que são quem está em maior risco não se fala.
As capacidades exigidas aos treinadores se fossem possíveis de reunir numa só pessoa seria algo próximo do “Super Homem”. O treinador depara-se com vários problemas, consigo próprio e com os outros, como a comunicação, liderança, decisões, sessão de treino, competição, objectivos, expectativas, resultados, falta de tempo, imagem.
Ter que emigrar em busca de oportunidades, os quadros competitivos cada vez mais intensos, desequilíbrios entre a vida pessoal e profissional, cada vez mais horas fora de casa e das famílias, passados nos centros de treino, estágios, viajar, competir.
Os despedimentos cada vez mais frequentes, dai as expressões: “A mala está sempre aberta” ou “a chave está no automóvel”, e a fragilidade dos apoios no desemprego.
Quem necessita mais de treino mental no desporto? Todos, mas talvez seja o treinador.
Vou oferecer-te a seguir 10 passos que te podem ajudar a reflectir, a teres clareza.
1) Onde está o teu foco?
Quem vive focado em problemas não vê soluções. Ao ficares na dor, onde é que estás? No problema ou na solução?
O sofrimento e a dor são reais e legítimos, mas pergunto-te gentilmente queres ficar aí ou sair daí?
Com a dor a pessoa sabota-se, sofrer não é algo nobre, as pessoas não têm que ficar anos a sofrer. O que ocorre quando algo não está bem e não alteras o que acontece? Consolidas os problemas.
2) Seguir em frente é uma boa opção
Se avanças e recuas, avanças e recuas ou andas às voltas ou não sais do lugar o que te parece
que está a acontecer? É isso que queres? O que vais fazer com isso?
O relógio não para, mesmo quando estás parado. Como seria teres soluções para o que necessitas, adquirires competências que fizessem a diferença na tua vida e em quem está à tua volta. Nem tudo se resolve do dia para a noite e aí precisas de dar os próximos passos. Ajudar a pessoa a dar os próximos passos, de hoje, amanhã e depois.
São necessários instrumentos que ajudem as pessoas a estarem alinhadas para terem resultados, que necessitam ser cada vez mais rápidos. O que realmente queres?
"AS CAPACIDADES EXIGIDAS
AOS TREINADORES, SE FOSSEM
POSSÍVEIS DE REUNIR NUMA
SÓ PESSOA, SERIA ALGO
PRÓXIMO DO “SUPER HOMEM"
3) Afirma o teu sorriso
Encara os problemas com descontração, humor, como algo divertido não é simples, mas é uma capacidade. A tendência é agires muito seriamente e sofres mais.
Apostares no sorriso é o que transforma o trabalho em divertimento, a situação torna-se mais leve. Quanto mais te divertires no teu trabalho, gostares do que fazes, mais activo(a) serás e por inerência o teu envolvimento, a tua vida será melhor e à tua volta.
A dúvida e a incerteza interferem nas aptidões, consequentemente na vida e são das maiores perturbações, parece-me que existe demasiada seriedade, muita hesitação e pouca paixão.
4) Desenvolve crenças de sucesso
Não conheço ninguém com resultados que tenha uma linha de orientação negativa. Gastas muito tempo a verificar o que pode correr mal?
Estás atento às pessoas que não alcançam o que desejam?
Gastas uma parte considerável do teu tempo e da tua energia à procura do que pode dar errado? É o que se chama de profecia auto-realizável. Podes acertar ou errar, o que procurares vais encontrar.
Mesmo prevenidos teoricamente, antecipando a realidade, a prática traz-nos emoções e é imprevisível, mas quando olhas para o que ainda não aconteceu sabes que vai dar certo.
5) Facilita a tua adaptação
Se olhares para o que pode correr mal, se só olhares para aí, é isso que vais encontrar. Se procurares o que pode dar certo, também encontras. O que me parece é que tudo isto acaba por resultar da in/capacidade de adaptação ao contexto em que te inseres.
Quando olhas para as tarefas e para a vida com optimismo, como um desafio a adaptação acontece, creio inclusive que esse ajuste ocorre ao nível celular.
Quando as pessoas se sentem mal, queixam-se, lamentam-se, decepcionam-se, inclusive em contextos sociais pacíficos, o que te parece que está a acontecer? O que te parece que vai desencadear?
Nós somos capazes de existir em qualquer lugar, adaptamo-nos às condições mais incríveis.
Foi precisamente nos contextos mais adversos em que já estive e vivi que encontrei as pessoas mais felizes. Porque será?
6) Constrói bons sentimentos
As emoções são altamente contagiosas, isto serve para umas e para outras.
Se os bons sentimentos nos fazem bem, então devemos criá-los, não te parece?
A tua experiência depende de onde estás focado(a), muda não somente o mundo externo, mas sobretudo o interno. Uma das melhores formas de fazer isso é levar as pessoas a falarem menos, ouvirem e ouvirem-se mais.
Eu tenho que! Não tens nada, isso é uma obrigação. Mas eu quero! Assim estou de acordo porque isso é uma escolha, um desejo.
7) Acredita em ti
Senão o fizeres quem fará?
Começa com a capacidade de aprenderes a acreditar, seres capaz de abrir as tuas janelas, as pessoas são como paraquedas, só funcionam se estiverem abertas.
Pensa num problema que tenhas neste momento. Imagina que entras num outro estado, mais agradável, tenta agora um novo caminho, tente ainda um outro novo caminho e começas a descobrir alternativas e possibilidades. Tinhas um problema ou um desafio?
O Cristiano Ronaldo teve um processo duro principalmente no início, mas o que fez com isso? Sonhou, acreditou, com determinação, consistência, adaptou-se, trabalhou e evoluiu para concretizar a visão que tinha para si. Creio que continua assim aos 37 anos.
8) Aposta em ti
As pessoas fazem as melhores escolhas possíveis a cada momento, considerando as suas competências ou habilidades disponíveis tendo em conta o seu modelo do mundo.
Existe sempre algo a melhorar! Mas, só quando estabeleces a necessidade de entrares noutro nível, é que surge a atitude de desenvolvimento pessoal ou profissional.
Se estás descompensado(a), não estás feliz, então sorri, alegra-te. Não tenho vontade! Sorri na mesma até teres vontade, conserta-te antes de te aproximares de alguém.
Cuida de ti e percebe que tens escolhas melhores e mais saudáveis. Cria esperança, isso é algo muito poderoso e deve ser desenvolvido nas pessoas.
9) Para onde nos dirigimos
Estamos a viver uma era em termos de informação como nunca vista. O conhecimento está a dobrar em todas as áreas a cada ano. As pessoas têm que fazer um grande esforço porque caso contrário num curto espaço de tempo ficam desactualizadas, bem como a sobrecarga informacional que é bastante elevada a todos os níveis.
A próxima geração talvez tenha que ser mais criativa e saber resolver problemas melhor do que nunca ou então o que te parece que poderá acontecer?
Quem está perante contextos “desafia dores”, tem muitas vezes a necessidade de fazer mais com menos, para se proporcionarem às pessoas mais possibilidades do que nós tivemos.
Falar de agentes desportivos, treinadores, jogadores, dirigentes, agentes, árbitros, fisioterapeutas e por aí vai a palavra de ordem são desempenhos, vitórias, ganhar.
As pessoas não estão prontas para todas as exigências com que se deparam e precisam de ajuda para continuarem a crescer, de prevenção.
10) Considerações
Surpreende-me que as pessoas se surpreendam de ficarem surpreendidas de não terem resultados no que não treinaram.
Têm acontecido várias tragédias e existe demasiado sofrimento silencioso, o sofrimento poderá não resultar da dor, mas da falta de clareza em lidar com a dor.
A maior parte das pessoas espera por tragédias, crises, traumas, doenças, diagnósticos ou problemas graves, mas a mudança pode realizar-se num estado de satisfação e inspiração em vez de dor e sofrimento.
Mas quem pode preparar mentalmente e emocionalmente os agentes desportivos?
Têm que ser pessoas altamente preparadas, experientes, temos que estar bem treinados, sermos profissionais, especialistas, temos responsabilidades, as pessoas depositam-nos essa confiança, essa necessidade e isto deve ser levado muito a sério.
Uma das vias é continuar a aprender, para crescer e desfrutar!
Artigo escrito para a Revista Futebol Estudado. Se quiseres ter acesso a todos os artigos deste número da Revista acede no link a seguir:
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